“Afinal de contas, o que é escrever, falar, verbalizar, senão tentar captar um real que não cessa de resistir e de se subtrair ao domínio de todo discurso e, paradoxalmente, de toda significação? Que se pense, por exemplo,nas ideias de Platão, nos universais dos escolásticos, no Deus de Descartes, nas mônadas de Leibniz, no imperativo categórico de Kant, no espírito absoluto de Hegel e, mais recentemente, no arcabouço terminológico da biologia e da química, últimos bastiões em que vieram refugiar-se as entidades fictícias da metafísica e da teologia”.
Eros e Tânatos: A vida, a morte, o desejo. São Paulo, Loyola, 2007, p. 18.
“Todos os filósofos, de Heráclito a Heidegger, de Platão a Lacan, não fizeram outra coisa senão ensaiar apreender – a partir de uma sensação de borda ou em torno de um vazio que suscita a inscrição ou o traçado centrífugo da letra – aquela unidade, aquele fundamento, aquela palavra ou, em suma, aquele significante que, não obstante, permanece recalcitrante e resistente ao próprio discurso”.
A fragmentação da cultura e o fim do sujeito. São Paulo, Loyola, 2012, p. 17.
Rogério Miranda de Almeida nasceu em Crato, estado do Ceará, aos 9 de abril de 1953. É filho de José Rogério de Almeida e de Nair Miranda Rogério. Na sua cidade natal, cursou a escola primária no Grupo Escolar Dom Quintino e fez o ginasial e o científico (até o segundo ano) no Colégio Estadual Wilson Gonçalves. Concluiu o científico no Colégio Diocesano do Crato. Enquanto realizava seus estudos formais nestes dois colégios, estudou e aprofundou a língua e a literatura francesas com a professora Maria Sílmia Sobreira da Silveira (Aliança Francesa). Em seguida, no Rio de Janeiro e, depois, em Campinas-SP, estudou privadamente o grego clássico e o latim (1974–1977). Cursou um ano de filosofia na PUC do Rio de Janeiro (1978) e concluiu a licenciatura em filosofia na PUC de Campinas (1985). Teve como sua primeira influência filosófica as leituras de Platão, Descartes, Rousseau, Kant e Marx.
De 1986 a 1993, cursou teologia na Universidade de Estrasburgo, França, onde obteve os diplomas: bacharelado, licenciatura, mestrado, D. E. A. (Diplôme d’Études Approfondies), D. S. T. C. (Diplôme Supérieur de Théologie Catholique) e doutorado. Nesta mesma universidade, foi membro do C.É.R.I.T. (Centre d’Études et de Recherches Interdisciplinaires en Théologie). Na Universidade de Metz, França, doutorou-se em filosofia (1997).
De 1995 a 2003, lecionou teologia e filosofia no Saint Vincent College, Latrobe, Pensilvânia, Estados Unidos, onde também foi membro da Friedrich Nietzsche Society e da American Philosophical Association. Entre 1997 e 2007, lecionou filosofia, com ênfase em ética e antropologia filosófica, no Pontifício Ateneo Santo Anselmo, Roma. Nesta mesma cidade, lecionou teologia moral e teologia sistemática na Pontifícia Universidade Gregoriana (1999–2007). Em 2007, após a criação do programa de pós-graduação em filosofia na PUCPR, campus Curitiba, foi convidado para lecionar nesta universidade, onde atuou no mestrado e no doutorado até 2019. No presente, leciona filosofia na FASBAM (Faculdade São Basílio Magno) e teologia sistemática no Centro Universitário Claretiano (Studium Theologicum), ambos em Curitiba.
Nas suas aulas e conferências, nos artigos publicados em revistas nacionais e internacionais, assim como nas obras que até hoje escreveu, o autor tem como referências principais:
As pesquisas e análises de Rogério Miranda de Almeida não podem ser dissociadas destas três áreas do saber: filosofia, teologia e psicanálise. Com efeito, considerando-se que a problemática fundamental que norteia o seu trabalho intelectual é de ordem antropológica, não se pode concebê-la sem se levar em conta a finitude da existência e, portanto, as questões da liberdade, do desejo, da linguagem, do sujeito e do inconsciente. É, pois, a partir desta perspectiva que ele examina:
Isto não quer significar que a filosofia, a teologia e a psicanálise dependam uma da outra do ponto de vista estritamente epistêmico. Não! Cada uma destas três ciências possui suas próprias leis, seu próprio estatuto e seu próprio objeto de indagação ou de análise. Assim, o objeto peculiar à filosofia é o Ser enquanto Ser, o objeto da teologia é Deus e o da psicanálise o inconsciente. Resta, contudo, que todo enunciado é um enunciado feito pelo homem, a partir do homem e em torno do homem. De sorte que aquilo que importa destacar é, em primeiro lugar, o problema da linguagem, do inconsciente, da interpretação e, em última instância, do desejo.
Uma das noções de que mais se serve Rogério Miranda de Almeida é a de “paradoxo” e, em conexão com esta, a de “entre-dois”. Na esteira de seu mestre, Roland Sublon, e de Jacques Lacan, ele designa, pelo nome de “paradoxo”, a multiplicidade de perspectivas e releituras que um mesmo objeto, ou diferentes objetos, podem suscitar. Pois o que está em jogo na dinâmica da interpretação e da escrita é o problema da tensão do desejo e de sua incessante significação através do simbólico do real. Trata-se, para dizê-lo em outros termos, da letra ou, mais precisamente, do vínculo, da ponte, da porta, da passagem, do intermediário ou, na sua terminologia, do entre-dois. Estas duas noções – o paradoxo e o entre-dois – se entrelaçam e se supõem de maneira tão intrínseca, mútua e radical que toda tentativa para de-fini-las estaria, desde o início, fadada ao mais completo fracasso. Com efeito, como definir aquilo que, por natureza, está continuamente a escapar, a transformar-se, a metamorfosear-se, a oferecer-se e a resistir à significação enquanto tal? Num comentário a uma das obras de ALMEIDA, Nietzsche e o paradoxo – primeiramente publicada em francês (1999) – Jean-Paul Resweber observa: “Sabe-se que o paradoxo – que se exprime como um enigma, pois ele não resolve as contradições entre a vida e a morte, o ser e o tempo, a palavra e o silêncio, o sujeito e seu Outro – se dá como interface entre a ética e a experiência religiosa. Ora, é esta a ambição legítima deste livro: ler e reler Nietzsche no paradoxo, sem procurar resolver este último” (Le Portique – Revue de Philosophie et de Sciences Humaines, n. 5, 1er. Semestre 2000, p. 202-203).
Assim como as noções de paradoxo e entre-dois não podem ser pensadas separadamente na concepção de Rogério Miranda de Almeida, assim também o desejo, enquanto uma tensão elementar, primordial, cuja saciedade reside paradoxalmente na sua própria insaciabilidade, não pode ser dissociado da linguagem, ela mesma como expressão da tentativa infinitamente recomeçada de colmatar uma hiância ontológica, ou pré-ontológica, que se diz, se fala, se escreve e se significa. Consequentemente, o desejo, a linguagem e a interpretação caminham pari passu, na medida em que a própria linguagem já é a manifestação de um movimento centrífugo que, por isso mesmo, não cessa de se inscrever e de se simbolizar. Na linha de Jacques Derrida, Rogério Miranda de Almeida vê na escrita uma função transgressora e, portanto, uma dinâmica que tenta – da maneira mais ambígua e paradoxal – romper a hegemonia do logos que pautou, determinou e radicalmente caracterizou a tradição metafísica ocidental. Afinal de contas, o que é a escrita, o texto e, em última análise, a linguagem? É o próprio autor quem o responde no Prefácio ao seu Eros e Tânatos: “Escrita do impossível, arte da transgressão, trajeto sinuoso que pontilha a angústia de uma perda, de uma lacuna, de uma hiância e de um significante que não cessam de se re-inscrever, de se completar, de se refazer, de se deslocar e se repetir...” (Eros e Tânatos: A vida, a morte, o desejo. São Paulo, Loyola, 2007, p. 18).
Linhas de pesquisa:
Projetos:
Nietzsche et le paradoxe, Strasbourg, Presses Universitaires de Strasbourg, 1999.
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